COMO É FAZER VOLUNTARIADO NA ÁFRICA – Paulinele Alcará | Bolder Podcast 484

Em um episódio que cumpre a missão do Bolder Podcast de mostrar a realidade sem romantismo da vida no exterior, o apresentador Bolder (Fillipe Cardoso) recebeu a psicóloga brasileira Paulinelli Alcará para uma conversa profunda sobre sua experiência de voluntariado na África [00:00].

Paulinelli, que viveu um intercâmbio desafiador em Dublin, tomou a ousada decisão de embarcar em um projeto de cooperação internacional na área de educação em Malawi [01:28] – um país no sudeste africano, onde 70% da população depende da agricultura [02:11]. O que se seguiu é um relato honesto sobre choques culturais, a dura realidade da escassez e o verdadeiro papel do voluntário branco em um país de baixo Índice de Desenvolvimento Humano.

Da Estabilidade no Paraná ao Desgaste da Imigração na Irlanda

A trajetória de Paulinelli começou em Santa Helena, interior do Paraná, onde ela cresceu sem a mínima noção ou desejo de sair do país, achando que o mundo “acabava em Marechal Cândido Rondon” [07:36]. Foi na vida adulta, e após consolidar uma carreira de 10 anos na psicologia do trabalho, que a ideia de viver fora surgiu [14:27].

Curiosamente, ela relata que a experiência na Irlanda – um intercâmbio de seis meses para aprender inglês – acabou sendo mais desafiadora do que o próprio voluntariado na África [17:11].

  • A “Máquina de Lavar” em Dublin: Sair de um ambiente “super controlado” para uma cidade maior (Cascavel, 300 mil habitantes) e, depois, para Dublin, foi uma “máquina de lavar” que mexeu em todas as estruturas [12:00], [16:45].
  • O Estopim: A decisão de ir para a África veio após o desgaste físico de dois anos trabalhando em Dublin como cleaner e housekeeper [23:51]. Ela sentia que o trabalho braçal não a exigia intelectualmente e estava “emburrecendo” [25:10], buscando uma experiência que a desafiasse mais no inglês e no desenvolvimento pessoal.

A Preparação Rigorosa: Evitando Ser um “Branco de Férias”

O programa escolhido, pela ONG Humana People to People, exige uma preparação de três meses em uma escola no Reino Unido (UK) [27:37]. O custo total para essa preparação (moradia, comida, aulas e o mês final) foi de 3.700 pounds – a passagem para a África é paga pela própria ONG [01:58:03], [01:58:24].

O objetivo dessa preparação é desconstruir a visão do voluntário como um “salvador” [31:38]:

  • Teoria e Conceitos: As aulas abordam temas como colonização, o impacto da propaganda e a perspectiva dos privilégios brancos no desenvolvimento dos países africanos [30:17].
  • Aprender Fazendo: O treino prático de “aprender fazendo” exige que os alunos cozinhem, lavem a própria roupa, façam manutenção e plantem a horta na escola, preparando-os para a vida longe do privilégio [32:17].

A logística para a Paulinelli foi definida em conjunto com os nove voluntários da turma: através de um longo processo de consenso, eles decidiram que seis iriam para Malawi e três para Zâmbia [37:00].

Choques Culturais e a Corrupção Crônica do Malawi

A chegada ao Malawi foi um verdadeiro choque de realidade, começando na sede da ONG em Blantyre, a capital do sul [41:20]:

  • Escassez de Infraestrutura: Ao chegar, não havia energia elétrica, e consequentemente, não havia água para bombear a partir dos poços [43:46]. A falta de saneamento básico e o costume de queimar lixo (plástico) a céu aberto são problemas sérios [46:38].
  • O Custo da Escassez: O salário mínimo no Malawi é de cerca de 90.000 Kwachas (aproximadamente 45€) [01:20:30], enquanto 1kg de carne pode custar 30.000 Kwachas (14€) no supermercado [01:20:14]. A dieta é baseada quase inteiramente em chima (polenta de milho branco sem sal) [01:16:47], sendo que a proteína mais acessível é o rato assado no espeto [01:21:36].
  • Corrupção à Vista: Paulinelli relata que em um trajeto de apenas uma hora usando o transporte local (mini-bus), havia entre sete e nove paradas de policiais para cobrar “propina” [01:13:14].

A voluntária, que é psicóloga, se viu envolvida em atividades que iam da manutenção de estradas (carregando pedras em picapes, na pá) [55:04] a levar conceitos de saúde mental (o que é tristeza, raiva, relaxamento) para os jovens professores [57:08].

A Função Pedagógica do Trabalho Braçal

A princípio, Paulinelli questionou o trabalho braçal, mas percebeu seu profundo valor pedagógico:

“Quando eles veem um branco com eles consertando uma estrada, tem um papel pedagógico extremamente importante. Eles vendo que [existe] uma humanidade aí… nos humaniza um pouco mais como humanos, sem distinção de cor.” [58:53] / [59:26]

O trabalho nas pré-escolas era vital, já que a pré-escola não é uma atribuição do governo [56:20]. Para Paulinelli, o momento de maior satisfação era criar o projeto Bucotime e ler para as crianças, ensinando as professoras a fazer o mesmo, utilizando a biblioteca de mais de 200 livros doados [01:01:53].

“Azungo” e o Dilema do Desenvolvimento Sustentável

A psicóloga compartilhou dois pontos cruciais que a fizeram refletir sobre o desenvolvimento:

  1. O Grito do “Azungo”: As crianças frequentemente a abordavam na rua gritando “Azungo, azungo”, uma palavra em titeua (língua local) que significa “branco” ou “gringo” [01:35:49]. Embora inicialmente tenha se sentido desconfortável e com a sensação de racismo, ela entendeu que era a maneira deles de a saudar e de identificá-la [01:37:34].
  2. O Privilégio Branco como Ferramenta: A Paulinele conta que a professora local admitiu que ela “jamais seria atendida se fosse lá sozinha” pelo Ministro da Educação [01:05:18]. Ela e seus colegas eram atendidos porque eram brancos voluntários [01:05:26]. O desafio é saber usufruir desse privilégio para conseguir que o desenvolvimento e as doações cheguem, sem cair na armadilha do “salvador” [01:05:03].

No entanto, o maior dilema é a sustentabilidade: “A cultura come a estratégia no café da manhã” [01:07:19]. Paulinelli afirma que as coisas deixam de acontecer porque não têm aderência ao modo de vida do país [01:08:07]. Ela compara a realidade de Malawi com o Brasil de 100 anos atrás em questões básicas como água encanada e eletricidade [01:49:48].

O Legado Pessoal e o Chamado à Ação

A experiência foi transformadora e ensinou uma lição de vida fundamental: os malauianos “dão jeito com os recursos que eles têm” [01:34:33]. Paulinelli também se inspirou em histórias como a da professora Dorica [01:29:34] e o menino Clemente, um adolescente perspicaz que usou um carvão e a palmilha de seu chinelo (croque) para anotar o telefone de Paulinelli [01:34:18], demonstrando sua astúcia.

Embora não pretenda voltar em um novo programa agora, a psicóloga considera que a experiência foi um preenchimento pessoal e uma excelente maneira de desenvolver o idioma para quem está em um intercâmbio de inglês no exterior [01:56:40], [01:59:50].

Se você deseja conhecer mais sobre a experiência de Voluntariado no Malawi, a Paulinelli Alcará está disponível para compartilhar mais detalhes em suas redes sociais: Paulinelli Alcará (o link está na descrição do vídeo!) [02:00:53].


Quer saber todos os detalhes e assistir à entrevista completa? Confira o episódio Bolder Podcast 484 no link abaixo, e não se esqueça de se inscrever no canal do Bolder!

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